sexta-feira, 9 de março de 2012

O PODER DOS ORIXÁS:

O poder dos orixás:

Fortes, festeiros, sensuais, os deuses africanos aportaram aqui junto com os escravos e conquistaram gente de todas as raças e credos. Descubra os segredos do axé

Adriana Pavlova
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(Ilustração: Fernanda Guedes)
O magnetismo dos deuses africanos

Você já deve ter pulado sete ondas em homenagem a Iemanjá, provavelmente também já viu alguma conhecida usando branco às sextas-feiras só para agradar a Oxalá. Sepelos dados do Censo 2000 há cerca de 530 mil brasileiros que professam as religiões afro-brasileiras, o número de pessoas que acredita no poder dos orixás - e no axé, a força vital concedida por eles - é muito maior. O magnetismo dos deuses africanos que regem as matas, os oceanos, os ventos e as tempestades ultrapassou a fronteira dos terreiros para exercer sua influência sobre adeptos dos mais variados credos ou até mesmo sobre aqueles que não professam religião alguma, mas reverenciam a natureza. Reinando absolutos no candomblé, a religião trazida da África pelos escravos, os orixás também estão presentes na umbanda, que nasceu no Brasil no início do século 20, misturando elementos de ritos africanos, catolicismo, espiritismo e ocultismo. Nesse caldeirão da umbanda, eles convivem com entidades como os caboclos e pretos-velhos, de linhagem inferior, já que não são deuses, e sim espíritos. A coreógrafa Ana Vitória se apaixonou pelos orixás durante um curso de dança afro na Universidade da Bahia. A atração foi tão grande que nem a sólida formação católica nem os anos passados em colégio de freiras constituíram obstáculo para aaproximação. Sou protegida de Oxóssi e filha de Oxum, a deusa do amor e da fertilidade. Estava tentando ter uma segunda filha quando dancei para ela num espetáculo-solo. Com isso, acho que abri um canal, pois logo depois engravidei."
Na opinião da antropóloga Rita Segato, o panteão africano funciona como um zodíaco à brasileira, um poderoso instrumento de decifração e de leitura de personalidades, porque cada pessoa tem o próprio orixá baseado no seu jeito de ser. "Mas a palavra final é do jogo de búzios, que confirma quem será seu guia por toda a vida", ensina ela, que também é professora da Universidade de Brasília e autora do livro Santos e Daimones: O politeísmo afrobrasileiro e a Tradição arquetipal (Editora Universidade de Brasília). O famoso oráculo de búzios é consultado pelos pais e mães-de-santo do candomblé. Eles têm autoridade para dar conselhos e, além do "orixá de cabeça", apontam quem é o "juntó", um segundo protetor, que também influi no caráter. Enquanto na África o panteão integra mais de 400 deuses, no Brasil a lista não ultrapassa duas dúzias, entre os quais há nove que disparam em popularidade: Iemanjá, Oxum, Ogum, Xangô, Oxóssi, Iansã, Obaluaiê ou Omulu, Oxalá e Exu. Todos contam com correspondentes na Igreja Católica, pois, como os escravos eram proibidos de cultuá-los, procuravam paralelos para despistar os senhores de engenho. Assim, Iemanjá é Nossa Senhora da Conceição; já o polêmico Exu não combinava com santo nenhum e foi erroneamente associado ao diabo. As razões são históricas, acredita Armando Vallado, sociólogo e pai-de-santo, autor do livro Iemanjá, A grande mãe africana do Brasil (Ed. Pallas): "Exu é um orixá brincalhão, o mediador entre os humanos e deuses. Sua aura de intensa sexualidade apavorou os jesuítas na época em que as religiões africanas chegaram ao Brasil". A questão é que, sem Exu, o mensageiro, não conseguimos nos comunicar com os deuses. "Por isso é importante tratá-lo bem, acendendo velas e oferecendo-lhe bebidas e comidas", explica o músico Luis Felipe de Lima. Filho de Oxalá, não descuida dos outros deuses e sabe como agradar a todos eles.
Os orixás estão à nossa disposição para ajudar a resolver qualquer assunto, seja dinheiro, saúde ou amor. A conhecida "amarração", por exemplo, é um rito para trazer amado para perto - cerimônia que nem todo pai-de-santo concorda em comandar porque envolve a manipulação de pessoas. As magias consideradas "maléficas" existem, porém são tabu e ninguém toca muito no assunto: alguns estudiosos afirmam que os trabalhos realizados nos terreiros dependem do grau de consciência do devoto (que faz o pedido) e dos chefes espirituais (que evocam os deuses para realizá-lo). De qualquer modo, a rígida fronteira entre bem mal e a noção de pecado do mundo judaico-cristão não fazem sentido no candomblé, que não estabelece regras de conduta. Como os deuses da mitologia grega, eles têm características admiráveis ou questionáveis, apresentando grande complexidade, o que só aumenta o seu fascínio.

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