sexta-feira, 11 de outubro de 2013

MANTOS DE NOSSA SENHORA SÃO ÍCONES DE DEVOÇÃO NO PARÁ:


Manto do Círio 2013 será apresentado nesta quinta-feira, 10.
Material para confecção da peça é doado por membros da comunidade.



Thais Rezende e Natália MelloDo G1 PA





Apresentação do manto de Nossa Senhora de Nazaré é um dos momentos mais aguardados pelos fiéis. (Foto: Tarso Sarraf / O Liberal)

A imagem de Nossa Senhora de Nazaré que teria sido encontrada pelo caboclo Plácido às margens do igarapé Murucutu, onde hoje fica a Basílica Santuário em Belém, vestia um manto "azul com gotas de orvalho", conforme conta a lenda que deu origem ao Círio de Nazaré. Cerca de 300 anos depois, essa tradição se mantém: a vestimenta que cobre a imagem da santa se tornou um dos símbolos do Círio. A apresentação do manto, um dos momentos mais esperados da festividade, ocorre nesta quinta-feira (10), às 18h.
Mantos são feitos com ouro e pedras preciosas.
(Foto: Mizar Bonna/ Arquivo pessoal)

Os mantos usados pela imagem de Nossa Senhora de Nazaré nas romarias do Círio são confeccionados, em sua maioria, com fios de ouro, pedras preciosas e bordados que dão à pequena imagem uma vestimenta equivalente a de uma rainha. O manto tem um significado especial de evangelização e é criado por um estilista. O material é doado por um casal da comunidade católica.

De acordo com a historiadora Rosa Arraes, para os fiéis que acompanham o Círio emBelém, o manto de Nossa Senhora simboliza proteção, amparo e amor. “Transmite e irradia a fé, portanto, presentear a Virgem de Nazaré com um manto é agradecer diretamente à nobre rainha do céu pela proteção e bênçãos concedidas, através de sua interseção perante Deus”, explica a historiadora.
Mízar Bonna e seu esposo, com o manto de 2008.
(Foto: Mizar Bonna/ Arquivo pessoal)

Promessa
Mízar Bonna desenhou 12 mantos para Nossa Senhora de Nazaré, nos anos de 1995 a 97, de 2001 a 2004 e de 2007 a 2011. A devota conta que nem pensava em fazer mantos até um pedido especial de seu esposo. “Foi uma promessa do meu marido, que ia operar o coração. Ele chegou com o padre e disse: quem vai dar o manto esse ano sou eu”, conta. A cirurgia foi bem sucedida e Mízar tomou gosto pelo trabalho.

“As ametistas do manto são verdadeiras, encrustadas em ouro e aplicadas. As pedras vermelhas são zircônias. Já vim trazendo uma lembrança religiosa: coloquei o símbolo da Ave Maria [AM] nas costas, emblema principal dela”, detalha sobre seu primeiro manto.

Segundo Mízar, a inspiração para a criação vem toda da Basílica Santuário de Nazaré. “Desde aluna do colégio Gentil, por volta de 1940, eu observava o trabalho da Esther Paes França, que desenhava criava e bordava o manto. Eu ficava encantada”, lembra Mízar, que foi membro da Confraria de Nossa Senhora de Nazaré e da Diretoria da Festa de Nazaré. Sem formação específica para desenhar os mantos, Mízar foi a criadora de belos mantos do Círio.

Excepcionalmente nos anos de 2001 e de 2002, Mízar desenhou dois mantos, um para a Trasladação e um para o Círio, ambos feitos pelo estilista Jorge Bittencourt. A preocupação era com a conservação dos mantos, que antes do Círio vestem a imagem em várias romarias.
Periquitos da Praça Santuário foram homenageados
no manto de 2010. (Foto: Mizar/ Arquivo pessoal)

São muitos os mantos, mas Mízar tem um carinho especial por alguns. “Um manto que me emocionou muito foi a primeira vez que usou-se o símbolo da Arquidiocese. Com rosáceas douradas, em alto relevo. Na costa trouxe uma aurora em homenagem às missões. Era ano do Rosário, 50 anos do Congresso Eucarístico”, afirma a desenhista sobre o manto do ano de 2008. “Eu me despedi (2010 - Manto da Alegria) com os periquitos italianos. Eles são as testemunhas barulhentas do primeiro Círio”, lembra.

Evangelização
A coordenadora da Festa de Nazaré em 2013, Thânia Vieira, conta que a escolha do estilista é feita pelo casal coordenador da festividade. “Nós, eu e o Kleber, escolhemos, levamos até o arcebispo, apresentamos e ele passa a ideia da concepção do manto para o estilista, o que ele quer que seja feito no manto, qual a inspiração”, revela.

Segundo Thânia, o trabalho feito pelos confeccionadores do manto era puramente artístico. “Antes, era um trabalho artesanal, criativo. Hoje, o estilista estuda o assunto. Ele precisa se preparar para conhecer o tema. Em 2012, o tema foi a passagem bíblica do Apocalipse 12. Hoje tem o trabalho artístico mais a evangelização, você traz no manto passagens bíblicas. Ano passado, no nosso primeiro ano com o Carlos Amílcar, o Dom Alberto disse: ‘tenho que lhe parabenizar, isso não é um manto, é um estudo teológico’. Isso foi muito emocionante”.
Manto de 2012 teve como tema foi a passagem bíblica do Apocalipse 12. (Foto: Tarso Sarraf / O Liberal)

Carlos Amílcar foi escolhido novamente para confeccionar o manto em 2013. “Ele faz com muito amor. Ele estudou o que o Dom Alberto passou pra ele. É muito mais do um trabalho artístico”, afirma Thânia.


A pedido de Dom Alberto, esse ano ele vem amazônico"
Thânia Vieira, coordenadora da festa

Os nomes do casal de doadores do manto são preservados. “Dos ícones do círio é o que é mais requisitado para doação. Pedimos a corda, flores da berlinda, mas o manto é o mais requisitado. Já temos gente querendo doar o manto até 2016. Acho que é porque é o que veste Nossa Senhora, é uma tradição muito forte, tanto que fica aquela expectativa. Para o católico paraense que é devoto, é uma simbologia muito forte”.

O manto que cobre a imagem de Nossa Senhora de Nazaré durante as romarias passou a ser uma verdadeira joia. Sobre qual será o tema deste ano e os materiais que serão usados, Thânia faz suspense, mas dá uma dica para o devoto da santinha. “A pedido de Dom Alberto, esse ano ele vem amazônico, mas é só isso, não posso dizer mais nada”, brinca a coordenadora.
Registro dos primeiros mantos mostra que peça
era maior que a imagem. (Foto: Thais Rezende/ G1)

História
Os mantos sempre foram utilizados para vestir as imagens da Virgem de Nazaré e têm o significado de proteção. Diferente da sofisticação dos dias atuais, registros históricos dão conta que os primeiros mantos eram maiores que a imagem e tinham até anágua.

De acordo com o registro de Mízar Bonna, que confeccionou 12 peças usadas no Círio, o manto ganhou um formato triangular perfeito e armado em 1953, com um desenho da estilista Vivi Martins, que levou ouro e pedras ao manto.

Segundo a historiadora Rosa Arraes, inicialmente o manto não era confeccionado todos os anos, devido ao alto custo financeiro. A imagem usava o mesmo manto por um tempo e percorria ainda as festividades do interior. A situação ação mudou, quando a irmã Alexandra, da Congregação das Filhas de Sant’Ana do colégio Gentil Bittencourt, dedicou-se a confeccionar um manto a cada ano, custeado por fiéis promesseiros.

Com a morte da irmã, assumiu o lugar Ester Paes França e, posteriormente, vários estilistas católicos ficaram com a missão de desenhar e confeccionar os mantos da padroeira dos paraenses, mantendo a tradição.

Rosa Arraes restaurou mantos antigos. Para ela, patrimônio deveria ser tombado. (Foto: Thais Rezende/ G1)

Rosa Arraes pesquisou o acervo de mantos guardados na Diretoria da Festa de Nazaré para a exposição dos mantos no Memorial do Círio. Restauradora, ela fez retoques nas peças e acredita que o rico acervo faz parte da cultura do povo paraense. “Alguém precisa pedir o tombamento deles. O manto é de rainha, como ela é a rainha da Amazônia”, afirma Rosa.
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Belém

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