sábado, 16 de novembro de 2013

OS CINCO ELEMENTOS NO XAMANISMO, NO TANTRA E NO DZOGCHEN DO TIBETE:



Este texto simples e didático foi extraido de um livro do meu mestre Geshe Tenzin Wangyal Rinpoche, chamado A Cura Através da Forma , da Energia e da Luz. É uma pérola. O ideal é lê-lo com calma e atenção, porque em cada frase está despretensiosamente apresentada uma base da compreensão do mundo concreto e sutil em que nos movemos neste planeta, das coisas que nos cercam, e do nosso interior. Um privilégio.
Vamos lá:
"Na cultura tibetana, os cinco elementos – terra, água, fogo, ar e espaço – são considerados a substância de todas as coisas e processos. O estudo de suas interações permeia o pensamento tibetano. O conhecimento dos elementos forma a base da medicina, da astrologia, do calendário e da psicologia, assim como as tradições espirituais do Xamanismo, do Tantra e do Dzogchen.

Os nomes dos elementos são simbólicos. Eles definem qualidades e modos de ação específicos por analogia com os elementos conhecidos do ambiente natural. Como acontece na maioria das culturas, a tradição tibetana usa os elementos naturais como metáforas fundamentais para descrever forças internas e externas. As propriedade físicas, por exemplo, são atribuídas aos elementos: a terra é a solidez, a água é coesão, o fogo é temperatura, o ar é movimento e o espaço é a dimensão espacial que concilia os outros quatro elementos ativos. Além disso os elementos estão associados a diferentes emoções, temperamentos, direções, cores, sabores, tipos de corpo e caráter, doenças e estilos de pensamentos. Dos cinco elementos vem os cinco sentidos e os cinco campos de experiência sensorial; as cinco emoções negativas e as cinco sabedorias; e as cinco extensões do corpo. Eles são os cinco pranas ou energias vitais. São os componentes de todo fenômeno físico, sensorial, mental e espiritual.

O uso metafórico dos cinco elementos também é usual nas línguas ocidentais: uma pessoa pode ser aérea ou ter os pés na terra, pode ser fluida ou fogosa. A raiva é quente, a tristeza é molhada. Uma atitude pode ser arejada ou terra-a-terra.

Mas nas tradições tibetanas os elementos não são entendidos só metaforicamente: os elementos da natureza são uma representação concreta de uma distinção mais sutis e fundamental dos cinco aspectos da energia primordial da existência. Não existe nada em nenhuma dimensão, que não seja totalmente composto pelas interações desses cinco aspectos da energia. Os processos elementares criam, Mantém e finalmente destroem o universo. Isso vale também para os seres individuais: no nascimento, o jogo dos elementos cria o corpo, a mente e a personalidade.Na hora da morte esses se dissolvem à medida que os elementos se desorganizam. Além disso, durante a vida, a relação da pessoa com os elementos determina a qualidade da experiência.

A idéia de elementos traz poucos benefícios quando se limita a uma abstração, a uma forma de dividir tudo por cinco. A compreensão dos elementos é útil quando está relacionada à experiência e é usada positivamente para melhorar a qualidade da nossa vida. Mas antes de poder aplicar esse conhecimento temos que nos familiarizar com os elementos, começando a nos relacionar com eles por meio de imagens e metáforas.

O corpo humano evoluiu por centenas de milhares de anos mediante a sua relação com o ambiente físico. Essa história fica evidente na satisfação que sentimos diante da beleza natural; a interação com os elementos naturais pode curar e renovar.
Apreciamos a terra limpa do deserto e o solo fértil do jardim. Tiramos férias à beira do mar, perto de um rio ou de um lago. Relaxamos no banho. Ficamos extasiados pela chama e gostamos do calor do sol ou do fogo na lareira. Inspiramos profundamente para nos acalmar, suspiramos para afugentar a trsteza, visitamos as montanhas para nos sentir revigorados pelo ar puro. E o céu, a imagem externa do espaço nos fascina – a cor, as manifestações atmosféricas que ele exibe e a luz que o permeia. Relaxamos em espaços vastos e abertos e nos sentimos seguros em espaços fechados e confortáveis. Ou ficamos ansiosos em espaços amplos e sentimos claustrofobia em espaços fechados. De uma maneira ou outra reagimos. Quando ficamos privados de um dos elementos, ansiamos por ele. No deserto ficamos felizes quando encontramos água. Depois de um longo tempo no mar, temos vontade de beijar a terra quando desembarcamos. Quando estamos com frio, corremos para o fogo. Os cinco elementos nos afetam profundamente num nível profundo e instintivo, mas geralmente nos perdemos na superfície dessas experiências, sem perceber que a intimidade com os elementos pode nos ligar ao sagrado e nos conduzir à cura, ao equilíbrio e ao entendimento mais profundo de nós mesmos.

Pode ser que cinco elementos seja muito pouco para explicar toda a diversidade das coisas e dos seres, mas os cinco elementos são cinco distinções que se ramificam continuamente em outras divisões sutis.

Essa compreensão pode ser aplicada ao corpo, por exemplo. O tronco tem cinco apêndices principais:duas perna, dois braços e uma cabeça. Cada um desses se divide em outros cinco: cada braço e cada perna em cinco dedos, a cabeça nos cinco órgãos dos sentidos.

Uma formulação tradicional define a carne como terra; o sangue e outros fluidos do corpo como água, a energia elétrica e química, bem como o calor do metabolismo como fogo; a respiração, o oxigênio e outros gases como ar; e o espaço que o corpo ocupa, os espaços dentro do corpo e a consciência como elemento espaço. Cada um dos cinco pode ainda ser analisado ainda em termos de elementos: só na carne são encontradas a solidez (terra), a coesão (água), a temperatura (fogo), a motilidade (ar) e a consciência (espaço).Essas divisões também podem ser aplicadas ao sangue: nele há sólidos, fluidez, temperatura, movimento e espaço. Além disso, é claro, cada uma das subdivisões pode ser aplicada a outras decomposições em cinco, até que finalmente, qualquer coisa possa ser reduzida a às cinco energias elementares essenciais.

As interações dos cinco elementos dão origem não apenas a partes do organismo, a corpos, planetas, programas de computador e árvores, como também a todos os domínios da existência em cada dimensão. O dinamismo dos cinco elementos é subjacente a tudo o que existe.

OS TRÊS NÍVEIS DA PRÁTICA ESPIRITUAL

O uso dos elementos na prática espiritual varia, dependendo de a abordagem ser do Xamanismo, do Tantra ou do Dzogchen. Ou seja, o nível externo, interno ou secreto.

EXTERNO

Externamente os elementos não são apenas os elementos brutos da nossa experiência sensorial – a terra onde vivemos, a água que bebemos, o fogo que nos aquece, o ar que respiramos e o espaço através do qual nos movemos: são também os espíritos ligados a eles. Entre estes estão as deusas, os espíritos elementais e outros seres. Trabalhar com esses seres é uma prática muito comum na cultura tibetana e pertence ao domínio do que estou chamando de Xamanismo, embora eu queira deixar claro que não existe a palavra “xamanismo” na linguagem tibetana.

As tradições tibetanas que trabalham com os espíritos vem da Tradição Bön, mas hoje são encontradas em toda a cultura tibetana. No Tibete muitas decisões de dirigentes e altos lamas de mosteiros de todas as seitas são tomadas com base em consultas a oráculos humanos e seres não físicos. Os tibetanos não gostam de igualar essas práticas ao xamanismo, porque para alguns, a palavra está relacionada ao sacrifício de animais ou uma espiritualidade mais primitiva. O que estou discutindo aqui, não tem relação alguma com essas coisas. Trata-se de práticas ensinadas nos quatro primeiros dos nove níveis de ensinamentos do Tradição Bön dos Tesouros do Sul dos ensinamentos Bön.

INTERNO

Os elementos internos são energias elementares e não suas formas. No corpo, são as energias físicas que bombeiam o sangue, digerem comida e estimulam os neurônios, bem como as energias mais sutis das quais dependem a nossa saúde e as nossas faculdades. Algumas dessas energias sutis são hoje estudadas no Ocidente graças a uma nova familiaridade com os modelos médicos orientais que informam a Acupuntura e os novos usos que pesquisadores ocidentais da área médica estão descobrindo para diferentes tratamentos vibratórios. Existem também energias muito mais sutis que não podem ser detectadas por medições físicas, mas que estão disponíveis à experiência direta por meio das disciplinas yogues e contemplativas.
Esse nível mais sutil da energia elementar não é encontrado apenas dentro do corpo, mas é também a dimensão de energia que os profissionais competentes de Feng Shui – a arte chinesa da disposição dos objetos – sentem no ambiente. São também as manifestações de energia que se avolumam nos fenômenos de grupo como o comportamento das multidões, o patriotismo e coisas assim. O Tantra trabalha com essas energias guiando-as no corpo com propósitos específicos, por meio de métodos yogues diretos que envolvem postura, respiração, visualização e mantra. O Tantra vê as energias como forças divinas.


SECRETO

A dimensão secreta dos elementos existe além da dualidade, sendo portanto difícil de descrever por meio da linguagem, que divide necessariamente a experiência em objetos separados. Essa dimensão extremamente sutil da experiência é a radiância do Ser, as “cinco luzes puras” aspectos da luminosidade que, inseparavelmente ligada ao vazio, é a base de tudo. As práticas e ensinamentos ligados a esse nível dos elementos, são extraídos do Dzogchen, a Grande Perfeição.

Essa três dimensões só são separadas conceitualmente. Esse é um ponto importante que deve ser considerado durante a leitura deste livro. É um erro achar que os níveis externo, interno e secreto podem ser de fatos divididos, ou que a prática externa, o Tantra, e o Dzogchem são mutuamente exclusivos. A confusão sobe esse ponto leva a muitas divisões na crença: religiões que desconsideram a vida do corpo, culturas seculares que desconhecem a natureza sagrada da Terra, ou preocupações com o bem-estar material que negligenciam o desenvolvimento espiritual. A vida como um todo é importante e vem dos elementos sagrados.

A visão do Dzogchen é completa e engloba as outras, mas isso não significa que as visões inferiores devam ser negligenciadas. Acreditar que tudo é luminosidade insubstancial é muito diferente de conseguir atravessar paredes. A prática mais elevada é a mais eficaz e não necessariamente a que é categorizada como “superior”."
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